D.B. Cooper
O mistério que desafiou o tempo
HISTÓRIAS INCRÍVEIS
Arthur Noronha
5/16/20254 min read


O mistério que nunca pousou: D.B. Cooper e o sequestro mais enigmático da história dos Estados Unidos
Por Arthur Noronha
16 de maio de 2025
Na tarde úmida e nublada de 24 de novembro de 1971, véspera do feriado de Ação de Graças nos Estados Unidos, um homem de meia-idade, de aparência sóbria, terno escuro bem passado, gravata preta com prendedor de madrepérola e óculos escuros, atravessou os portões do aeroporto de Portland, no estado do Oregon. Nada em sua postura chamava atenção. Parecia mais um executivo de negócios, alguém que já fizera esse mesmo trajeto dezenas de vezes. Com tranquilidade, comprou uma passagem só de ida para Seattle, Washington, por vinte dólares em dinheiro. O nome que deu à atendente foi “Dan Cooper”.
A bordo do Boeing 727 da Northwest Orient Airlines, o homem se acomodou no assento 18C. Fumava com naturalidade, como era permitido na época, e tomou um bourbon com refrigerante. Tudo parecia absolutamente comum até que, pouco depois da decolagem, ele entregou discretamente um bilhete à aeromoça Florence Schaffner. Acostumada a receber recados pouco relevantes ou flertes inconvenientes, Florence o ignorou de início. Ele se inclinou e disse calmamente, quase sussurrando:
“Senhorita, é melhor ler isso. Eu tenho uma bomba.”
No bilhete, o homem exigia 200 mil dólares em dinheiro vivo, quatro paraquedas e a garantia de que todos os passageiros sairiam ilesos. Sem fazer qualquer escândalo, mostrou o conteúdo de sua maleta: fios, cilindros e o que parecia ser um explosivo improvisado, mas convincente. O aviso foi repassado à cabine. O comandante do voo seguiu rigorosamente as instruções, enquanto o FBI era acionado discretamente.
O avião circulou por quase duas horas acima de Seattle, enquanto as autoridades reuniam o dinheiro exigido e organizavam os paraquedas. O sequestrador se manteve sereno o tempo inteiro. Recusou fotos, manteve-se cortês com a tripulação e foi descrito posteriormente como calmo, educado e até gentil. Ele sabia exatamente o que queria e como conseguir. Quando o avião pousou no Aeroporto Internacional de Seattle-Tacoma, a polícia entregou os itens solicitados. Os passageiros foram libertados, sãos e salvos, e Cooper permitiu que parte da tripulação também deixasse o avião.
Mas ele ainda não havia terminado.
Com o dinheiro e os paraquedas a bordo, Cooper ordenou que o avião decolasse novamente, agora com destino ao México. Pediu que o voo se mantivesse abaixo de 10 mil pés de altitude e com a escada traseira liberada. Não queria ser acompanhado por caças nem arriscar ser interceptado. Às 20h11, em algum ponto entre Reno e a floresta densa do sudoeste de Washington, sob uma tempestade gelada e total escuridão, ele saltou da aeronave.
Nunca mais foi visto.
O FBI lançou uma das maiores investigações da história do país. Mais de 800 pessoas foram investigadas. Pilotos, paraquedistas, ex-militares, criminosos foragidos, homens desaparecidos e até freiras. Nenhuma hipótese foi descartada. Os agentes vasculharam matas, rios, montanhas e campos na tentativa de encontrar vestígios. Nada.
A única pista relevante apareceu em 1980, quando um garoto chamado Brian Ingram, acampando com sua família nas margens do Rio Columbia, encontrou três maços de notas enterradas na areia. As cédulas estavam danificadas, mas parte dos números de série ainda era legível. Confirmou-se que pertenciam ao montante entregue a D.B. Cooper.
E foi a essa altura que o nome “Dan Cooper” virou “D.B. Cooper”. Um erro cometido por um repórter local acabou se espalhando por toda a imprensa e se tornou definitivo na cultura popular. A partir dali, ele não era mais apenas um homem que saltara de um avião. Tornara-se um símbolo. Um enigma. Uma lenda americana.
Por décadas, teorias surgiram em profusão. Algumas plausíveis, outras absurdas. Houve quem afirmasse que Cooper morreu na queda, devorado por animais selvagens ou afogado em um rio. Outros garantem que ele sobreviveu, assumiu nova identidade e viveu uma vida discreta longe dos holofotes. Alguns acreditam que ele teria sido um ex-militar altamente treinado, talvez ligado à CIA ou a missões especiais. Há até quem sustente que ele foi resgatado por cúmplices em terra firme, em um plano milimetricamente calculado.
Em 2016, depois de 45 anos de investigações infrutíferas, o FBI encerrou oficialmente o caso. Não houve conclusões. Não houve prisões. O crime permanece sem solução. Mas a obsessão coletiva persiste. Documentários, livros, filmes e fóruns online continuam vivos, alimentando o imaginário em torno do homem que conseguiu o impossível.
A razão de tamanho fascínio não está apenas na ousadia do ato. Está no contraste. D.B. Cooper não foi violento. Não fez reféns em desespero. Não buscou notoriedade. Não deixou rastros. Agiu com frieza, inteligência e precisão. Em tempos onde todo crime é filmado por dezenas de câmeras e rastreado por satélites, Cooper representa o último dos fantasmas. O último a escapar da vigilância.
Hoje, o nome D.B. Cooper se mistura ao folclore. Não se sabe ao certo quantos ainda investigam sua identidade, mas todos, de alguma forma, ainda querem acreditar que ele sobreviveu. Que ele pousou em solo firme, escondeu o dinheiro, trocou de nome e viveu em paz. Porque, mais do que justiça, o que muitos buscam nesse caso é a confirmação de que a liberdade absoluta, ainda que por uma noite, foi possível.
Em um mundo cada vez mais controlado, a imagem de um homem saltando no meio da tempestade, com o vento cortando o rosto e a mala de dinheiro presa ao peito, é um lembrete de que ainda existem histórias que resistem à lógica. E D.B. Cooper, sem dúvida, é uma delas.