Euclides
O Homem que Traçou os Fundamentos do Saber
ÍNCONES DA HISTÓRIA
Arthur Noronha
5/22/20253 min read


Por Arthur Noronha
22 de maio de 2025
Numa época em que a civilização ainda aprendia a se organizar pelas palavras, pelas leis e pelas primeiras tentativas de sistematização do conhecimento, um homem cujas pegadas atravessaram milênios desenhou com precisão os contornos de uma ciência que nos acompanha até hoje. Esse homem é Euclides, um nome que ecoa silenciosamente entre fórmulas, esquadros e compêndios de matemática, mesmo para quem nunca ouviu falar diretamente dele.
Vivendo por volta do ano 300 antes de Cristo, na lendária cidade de Alexandria, no Egito, Euclides não foi um guerreiro, nem um governante, tampouco um profeta. Era um professor. Um estudioso. Um homem cujas ferramentas principais não eram a espada ou o cetro, mas a régua e o compasso. O que ele construiu, no entanto, foi tão poderoso quanto qualquer império: um edifício intelectual que ainda sustenta as colunas da geometria moderna.
É quase poético pensar que, em meio ao agito de uma cidade que fervilhava de ideias, onde bibliotecas guardavam os segredos do mundo conhecido, Euclides escolheu a exatidão das linhas e a harmonia das formas para construir um novo tipo de conhecimento. Seu trabalho mais célebre, conhecido como Os Elementos, é mais do que um tratado de matemática. É um manifesto sobre a ordem, a lógica e a beleza contida nas estruturas invisíveis do universo.
Os Elementos não foram apenas um compilado de fórmulas. Foram, sobretudo, uma forma de ensinar a pensar. Ao apresentar definições, postulados e teoremas, Euclides não apenas explicava — ele conduzia o leitor por uma jornada de raciocínio. Sua forma de expor a matemática era quase uma dança entre hipóteses e conclusões, levando o leitor a enxergar que nada era gratuito ou improvisado: tudo tinha um motivo, tudo nascia de algo anterior.
Mesmo com a escassez de registros sobre sua vida pessoal, estudiosos acreditam que Euclides tenha lecionado na famosa Biblioteca de Alexandria, um dos maiores centros de conhecimento da Antiguidade. Dizem que sua paciência era lendária, e que sua forma metódica de ensinar encantava tanto jovens estudantes quanto grandes intelectuais.
Um episódio bastante citado ,talvez mais lendário do que factual ,envolve um aluno que perguntou a Euclides o que ganharia ao aprender geometria. Sem hesitar, o mestre teria chamado um escravo e ordenado que desse uma moeda ao rapaz, “já que ele precisa lucrar com o que aprende”. É uma história que revela o espírito de alguém que via o saber como fim em si mesmo, não como meio para ambições pequenas.
O impacto de Euclides ultrapassou os séculos. Seu livro foi usado como manual padrão de geometria por mais de dois mil anos, sendo impresso em incontáveis edições e traduzido para dezenas de idiomas. Isaac Newton, quando escreveu seus próprios tratados revolucionários sobre física e cálculo, apoiava-se nos alicerces que Euclides havia assentado. Einstein, ao reformular nossa compreensão do espaço e do tempo, também caminhou pelas trilhas delineadas pelo velho mestre de Alexandria.
É curioso pensar que, numa época sem computadores, sem papel comum, sem sequer uma imprensa, alguém tenha conseguido organizar uma obra tão sólida que resistiria à passagem do tempo como se fosse esculpida em mármore. E, no entanto, o verdadeiro legado de Euclides não está apenas em seus livros, mas no modo como nos ensinou a pensar com clareza, a buscar a coerência e a enxergar a matemática não como um amontoado de fórmulas, mas como uma linguagem secreta da própria realidade.
Hoje, mais de dois milênios depois, enquanto engenheiros desenham pontes, arquitetos traçam edifícios e cientistas exploram as leis do cosmos, todos, de alguma forma, continuam dialogando com Euclides. Sua presença está ali, sutil mas constante, como uma voz antiga sussurrando sabedoria nas entrelinhas de cada cálculo, de cada medição.
Não é exagero dizer que, ao compreender um simples triângulo, estamos tocando, ainda que brevemente, a mente desse homem que viveu muito antes de nós e que, com régua e compasso, traçou não só figuras geométricas, mas também o caminho da razão humana.